Em 2013, Graciliano é o homenageado da 11ª Flip, Feira Literária de Paraty.


O alagoano Graciliano Ramos, conhecido pelo romance regional “Vidas Secas”, comprova em “Insônia” que sua literatura é Universal.
Insônia é um livro com 13 contos que traz, como personagem fiel e protagonista... a própria insônia! Insônia retrata uma trama psicológica e começa por um questionamento simples... SIM OU NÃO? É como um thriller, criando expectativa em torno das perguntas que despertam o homem no meio da noite.
Conheça toda a hesitação da Literatura Fantástica no conto “Paulo”.
Leia e comente seguindo as questões.
Paulo
Graciliano Ramos
PEDAÇOS DE ALGODÃO e gaze amarelos de pus enchem o balde. Abriram todas as vidraças. E no calor da sala mergulho num banho de suor. Já me vestiram diversos camisões brancos, que em poucos minutos se ensoparam. Não posso afastar os panos molhados e ardentes.
As crianças estiveram a correr no chão lavado a petróleo.
– Retirem essas crianças.
Inútil trazê-las para aqui, mostrar-lhes o corpo que se desmancha numa cama estreita de hospital. Não as distingui bem na garoa que invade a sala: são criaturas estranhas, a recordação das suas fisionomias apagadas fatiga-me.
– Retirem essas crianças barulhentas.
As paredes amarelas cobrem-se de pus, o teto cobre-se de pus. A minha carne, que apodrece, suja a gaze e o algodão, espalha-se no teto e nas paredes.
A alguns passos, uma figura de mulher se evapora. Aproxima-se, está quase visível, tem uma cara amiga, uma vida que esteve presa à minha. Mas essa criatura, dificilmente organizada, pesa demais dentro de mim, necessito esforço enorme para conservar unidas as suas partes que se querem desagregar.
As minhas pálpebras cerram-se, a mulher esmorece, transforma-se numa sombra pálida. Se me fosse possível falar, pedir-lhe-ia que me deixasse.
Os médicos estiveram aqui há pouco, fizeram o curativo. Enquanto amarravam a atadura, os enfermeiros me levantavam e eu me sentia leve, parecia-me que ia voar, flutuar como balão, esgueirando-me por uma janela, fugir do cheiro de petróleo e do calor, ganhar o espaço, fazer companhia aos urubus. As palmas dos coqueiros ficariam longe, na praia branca, invisíveis como a mulher que desapareceu na sala neblinosa. Os meus olhos não podem varar esta neblina densa.
Creio que dormi horas. O balde sumiu-se. Muitas pessoas falam, há um burburinho interminável na escuridão. Seria bom que me deixassem em paz. A conversa comprida rola na sala enorme; a sala é uma praça cheia de movimento e rumor.
A imobilidade atormenta-me, desejo gritar, mas apenas consigo gemer baixinho. Se pudesse, diria qualquer coisa à figura alvacenta, que tem agora as feições de minha mulher. Um assunto me preocupa, mas certamente ela não me entenderia se eu fosse capaz de expressar-me. Contudo necessito pedir-lhe que mande chamar o médico. A voz sai-me arrastada, provavelmente digo incongruências. Minha mulher espanta-se, uma grande aflição marcada nos beiços lívidos e na ruga da testa.
Aborreço-me, exijo que me levem para a enfermaria dos indigentes. Estaria lá melhor, talvez lá me compreendessem. Horríveis estas paredes. Sinto-me abandonado, lamento-me, injurio a criatura solícita que se chega à cama. Por que me olha com olhos de mal-assombrado?
Não percebeu o que eu disse? Bom que me mandassem para a enfermaria dos indigentes.
A ferida tortura-me, uma ferida que muda de lugar e está em todo o lado direito. Procuro convencer minha mulher de que o lado direito se inutilizou e é conveniente suprimi-lo.
A enfermaria dos indigentes. Que fim teria levado o médico? EIe me compreenderia, não me olharia com espanto e ruga na testa.
A minha banda direita está perdida, não há meio de salvá-la. As pastas de algodão ficam amarelas, sinto que me decomponho, que uma perna, um braço, metade da cabeça, já não me pertencem, querem largar-me. Por que não me levam outra vez para a mesa de operações? Abrir-me-iam pelo meio, dividir-me-iam em dois. Ficaria aqui a parte esquerda, a direita iria para o mármore do necrotério. Cortar-me, libertar-me deste miserável que se agarrou a mim e tenta corromper-me.
A neblina se dissipa, as paredes se aproximam, estão visíveis as folhas dos coqueiros e o telhado da penitenciária, o avental da enfermeira aparece e desaparece.
A ruga da testa de minha mulher desfez-se. Provavelmente, ela supôs que o delírio tinha terminado. Absurdo imaginar um indivíduo preso a mim, um indivíduo que, na mesa de operações, se afastaria para sempre. Arrependo-me de ter revelado a existência do intruso. Certamente, minha mulher vai afligir-se com a loucura que me persegue.
Fecho os olhos, vexado, como um menino surpreendido a praticar tolice. Finjo dormir: talvez minha mulher julgue que falei em sonho. Contenho a respiração, o suor corre-me na cara e no pescoço.
Lá fora eu era um sujeito aperreado por trabalhos maçadores, andava para cima e para baixo, como uma barata. Nunca estava em casa. Recolhia-me cedo, mas o pensamento corria longe, fazia voltas em torno de pensamentos desagradáveis. Recordações de tipos odiosos, rancor, a ideia de ter sido humilhado, muitos anos antes, por um sujeito que se multiplicava.
O nevoeiro embranquece novamente a ala, as paredes somem-se, o rosto da mulher mexe-se numa sombra leitosa. Torno a desejar que me levem para a mesa de operações, cortem as amarras que me ligam ao intruso.
Evidentemente, uma pessoa achacada tomou conta de mim. Esta criatura surgiu há dois meses, todos os dias me xinga e ameaça, especialmente de noite ou quando estou só. Zango-me, discuto com ela, penso em João Teodósio espírita e maluco. João Teodósio tem olhos medonhos, parece olhar para dentro e fala nos bondes com passageiros invisíveis. O homem que se apoderou do meu lado direito não tem cara e ordinariamente é silencioso. Mas incomoda-me. Defendo-me, grito palavrões e o sem-vergonha escuta-me com um sorriso falso, um sorriso impossível, porque ele não tem boca.
Tentei ler um jornal. As linhas misturavam-se, indecifráveis. Receei endoidecer, mastiguei uns nomes que minha mulher não entendeu, queixei-me do médico e de Paulo. Como ela não conhecia Paulo, impacientei-me, julguei-a estúpida, esforcei-me por me virar para o outro lado, o que não consegui.
Certamente, as criaturas que me cercam embruteceram, são como as crianças que estiveram correndo no chão lavado a petróleo. A enfermeira tem caprichos esquisitos, o médico não perceberá que é necessário operar-me de novo, minha mulher franze a testa e arregala os olhos ouvindo as coisas mais simples.
Comecei um discurso, uma espécie de conferência, para explicar quem é Paulo, mas atrapalhei-me, cansei e desprezei aquelas inteligências tacanhas. Tempo perdido. Sentia-me superior aos outros, apesar de não ser possível exprimir-me. Realmente, Paulo é inexplicável: falta-lhe o rosto e o seu corpo - é esta carne que se imobiliza e apodrece, colada à cama do hospital. Entretanto, sorri. Um sorriso medonho, sem dentes, sorriso amarelo que escorre pelas paredes, sorriso nauseabundo que se derrama no chão lavado a petróleo.
Escurece. A camisa molhada já não me escalda a pele: esfriou, gelou. E os meus dentes batem castanholas. Morrem os cochichos que zumbiam na sala. Alguém me pega um braço, dedos procuram a artéria.
A escuridão se atenua, o burburinho confuso reaparece, a camisa torna a queimar-me a pele, os dentes calam-se. Incomoda-me a pressão que me fazem no pulso, tento libertar o braço. A mão desconhecida tateia, procurando a artéria. Há um zunzum na sala, vozes confundem-se como num cortiço de abelhas. Sinto ferroadas terríveis na ferida.
Os dedos seguram-me, tenho a impressão de que Paulo me agarra. Um rumor enfadonho, provavelmente reprodução de maçadas antigas, berros de patrões, ordens, exigências, choradeiras, gemidos, pragas, transformam-se num sussurro de abelhas que Paulo me sopra ao ouvido. Agito a cabeça para afugentar o som importuno. Se pudesse, cobriria as orelhas com as palmas das mãos.
Afinal, ignoro quem é Paulo e reconheço que minha mulher tem razão quando me oferece pedaços de realidade: visitas de amigos, colheres de remédio, a comida intragável.
Devo aceitar isso. Curar-me-ei, percorrerei as ruas como os outros. A princípio, arrastar-me-ei pelos corredores do hospital, com muletas, parando às portas das enfermarias dos indigentes; depois sairei, a perna ainda encolhida, andarei escorado a uma bengala, habituar-meei a subir nos bondes, verei João Teodósio fazendo sinais misteriosos a um lugar vazio.
Preciso resistir às ideias estranhas que me assaltam. Bebo o remédio, peço a injeção, espero ansioso que o médico venha mudar a gaze e o algodão molhado de pus.
Entrarei nos cafés, conversarei sobre política. Uma, duas vezes por semana, irei com minha mulher ao cinema. De volta, comentaremos a fita, papaguearemos um minuto com os vizinhos na calçada. Não nos deteremos diante da porta de João Teodósio. Apressaremos o passo, fugiremos daqueles olhos medonhos de quem vê almas.
Em que estará pensando João Teodósio? Minha mulher interroga-me admirada, repete palavras incoerentes que dirigi a João Teodósio.
Sem querer, entro a palestrar com ele, de volta do cinema. Apoio-me à bengala e suspendo um pouco a perna avariada.
A ferida começa a doer-me horrivelmente. Não estou de pé, cavaqueando com um vizinho amalucado, estou de costas num colchão duro. Veio-me um acesso de tosse e o tubo de borracha que me atravessa a barriga parece um punhal. Gemo, o suor corre-me entre as costelas magras como as de um cachorro esfomeado. Tenho sede. A enfermeira chega-me aos beiços gretados um cálice de água. Bebo, ponho-me a soluçar. Os soluços sacodem-me, rasgam-me, enterram-me o punhal nas entranhas.
Estou sendo assassinado. Em redor, tudo se transforma. O avental da enfermeira ficou transparente como vidro. Minha mulher abandonou-me. Acho-me numa floresta, caído, as costas ferindo-se no chão e um assassino furando-me lentamente a barriga. As paredes recuam, fundem-se com o céu, as folhas dos coqueiros tremem e passa entre elas o cochicho que zumbe na sala.
Paulo está curvado por cima de mim, remexe com um punhal a ferida. Estertor de moribundo na floresta, perto de um pântano. Há uma nata de petróleo na água estagnada, coaxam rãs na sala.
Não conheço Paulo. Tento explicar-lhe que não o conheço, que ele não tem motivo para matar-me. Nunca lhe fiz mal, passei a vida ocupado em trabalhos difíceis, caindo, levantando-me, cansado. Peço-lhe que me deixe, balbucio súplicas nojentas. Não lhe quero mal, não o conheço.
Mentira. Sempre vivemos juntos. Desejo que me operem e me livrem dele.
Sairei pelas ruas, leve e o meu coração baterá como o coração das crianças. Paulo ficará na mesa de operações, continuará a decompor-se no mármore do necrotério.
O que estou dizendo a gemer, a espojar-me, é falsidade. Paulo compreende-me. Curva-se, olha-me sem olhos, espalha em roda um sorriso repugnante e viscoso, que treme no ar.
Uma figura branca desmaia. O burburinho finda. Alguém me segura novamente o braço, procurando a artéria. O punhal revolve a chaga que me mata.
RAMOS, Graciliano. Insônia. RJ: Record, 1997.
QUESTÕES
Aqui vão algumas questões para refletir sobre o conto “Paulo”.
Poste seus comentários. É a tarefa de 12/06 para a turma do 2º E.M.
1. Quem é a “voz” que conta a história, o narrador do conto “Paulo“? De que modo a escolha deste tipo de narrador afeta a história?2. Que episódio é narrado no conto? Que elemento extraordinário ou fora do comum desequilibra a realidade?
3. Dualidade: explique de que maneira ocorre dualidade tanto nos espaços descritos no conto, como na própria personagem masculina.
4. Em sua opinião, quem é Paulo?
1. O narrador do conto "Paulo" é o protagonista da história, a pessoa que sofre os surtos. Essa é a pessoa que se mantém na realidade, que faz o leitor ficar interessado e curioso, assim continuar lendo a história para descobrir como é o desfecho.
ResponderExcluir2. O conto é narrado no episódio do hospital, onde o protagonista está surtando e entrando no mundo fantástico. A parte em que o narrador fala "[...]Os soluços sacodem-me, rasgam-me, enterram-me o punhal nas entranhas.[...]", "[...]O punhal resolve a chaga que me mata.[...]" é uma das partes de "surto" do protagonista que é fora do normal, o qual se percebe bem a entrada do mundo fantástico.
3. O local onde o protagonista está, o hospital, faz de tudo para ajudar o protagonista voltar a realidade, mas a personagem masculina, o protagonista, também é persuadida por Paulo (mundo da fantasia).
4. Na minha opinião, Paulo é a segunda personalidade da personagem masculina, porque o protagonista é esquizofrênica (doença que consiste em ter várias personalidades). Ou Paulo pode ser a ponte do protagonista para o mundo fantástico.
1. a voz que conta a história é a da própria personagem principal, que por ser em primeira pessoa, causa certa aproximação dos fatos narrados com o sentimento, pois o narrador conta exatamente o que sente em relação aos acontecimentos da história.
ResponderExcluir2. é narrado um episódio de delírio ou surto da personagem principal em um hospital, que sente como se houvesse um outra pessoa nele mesmo, sendo esta o elemento que causa desequilíbrio na realidade do protagonista.
3. primeiramente é descrito um hospital, onde ocorre a realidade, mas esta se confunde com o imaginário durante os surtos da personagem, que passa a se ver num lugar mais nublado e obscuro. Além disso, a personagem se sente com duas faces e sente que uma toma poder da outra e passa a tirá-lo de sua realidade.
4. Paulo é "face alternativa" da personagem principal, em minha opinião é o corpo que domina a alma que vive na realidade.
Ps: se chegar outra resposta pra você gizele, é porque já tinha feito uma, mas o site travou quando fui enviar e apagou tudo, portanto se aparecer, considere a outra pois estava mais completa.
Olá, Juliana! Por enquanto só chegou esta mensagem.
ExcluirDepois que todos enviarem suas respostas, farei um comentário geral na classe e no blog!
Bjs.
1.A voz que narra a história é a do protagonista. A escolha de narrador-personagem faz com que o leitor sinta e se coloque no lugar,
ResponderExcluirassim como atiça sua curiosidade e o leva a finalizar a leitura.
2.No conto é narrado um episódio onde o narrador, que está no hospital, tem surtos e delírios. O elemento extraordionário que desiquilibra
a realidade é o fato dos surtos o levarem para um mundo irreal, tal como a criação de paulo.
3.Há dualidade nos espaços descritos no conto ao tratar do hospital, que teoricamente deveria curá-lo mas no entanto ele continua tendo delírios até mais fortes.
Acontece com a personagem masculina que se confunde sobre si mesmo.
4.Na minha opinião paulo é um fruto de sua imaginação. Ou sua outra personalidade (esquizofrênico) e por isso, talvez, ele não consiga explicar quem é Paulo. ele é a base para criação do conto fantàstico.
1. A "voz" que conta a história é o próprio protagonista, ou seja, é a pessoa que sofre tudo o que é desenvolvido na história. Essa escolha de narrador faz com que o leitor "viva" o acontecimento, ou seja, traz uma maior aproximação do leitor aos sentimentos que o protagonista demonstra.
ResponderExcluir2. O episódio narrado no conto, trata-se de um homem, um tanto quanto perturbado, doente em um hospital. O elemento fora do comum é o próprio "Paulo", porque ninguém consegue vê-lo (além dele) e também porque o protagonista não consegue se livrar dele. E também é a partir desse que o protagonista entra em um mundo "diferente" (fantástico).
3. A dualidade nos espaços do conto aparece no fato do hospital (que é um lugar onde se cuida de pessoas doentes) ser caracterizado como um lugar sombrio e obscuro. A dualidade com relação a personagem masculina ocorre a partir da "criação" de Paulo, que deixa de forma implícita a ideia que na verdade estava ali apenas para ajudar o protagonista,porém, acabando por perturba-lo mais ainda.
4. Paulo, na minha opinião, é um personagem fictício que foi criado pelo protagonista em seus momentos de delírio durante o tempo que ficou no hospital.
1. A "voz" que conta a história parece ser a consciência do próprio indivíduo, pois este não consegue se expressar nem fisicamente nem verbalmente. A escolha deste tipo de narrador cria um efeito de monólogo interno, em que é explicitado os conflitos que ocorrem dentro dele (podendo conter até seus sentimentos sobre isso).
ResponderExcluir2. O episódio é do personagem que enfrenta uma batalha diariamente contra o "intruso" dentro de si, que se apoderou (estranhamente) somente de seu lado direito. Esse homem não tem rosto nem corpo, ele é "inexplicável" (como fala o narrador), pois mesmo assim consegue xingá-lo e ameaça-lo todos os dias, mas principalmente durante a noite ou quando está sozinho.
O elemento fora de comum é o homem, que tem o nome de "Paulo". Ele não existe de verdade, possivelmente é fruto da subconsciência do narrador, criada por causa de algo que ocorreu em sua vida que o marcou (o que alimenta essa teoria é o fato dele até nomear essa voz).
3. A dualidade ocorre no espaço, em que no primeiro momento é o hospital, e em outro momento (plano da memória) é o "lá fora" - "Lá fora eu era um sujeito aperreado por trabalhos maçadores, andava para cima e para baixo, como uma barata."
Também ocorre com o próprio narrador a dualidade, pelo fato do intruso ser somente do lado direito, e o lado esquerdo o que "sobrou" de são.
4. Em minha opinião, é possível que este indivíduo esteja com algum tipo de distúrbio, por ver e ouvir coisas que, na verdade, não estão lá. No caso, seria um distúrbio mental. Sabe-se que o hemisfério dominante do cérebro (em 98%) é o esquerdo, responsável pelo pensamento lógico e competência comunicativa, enquanto o direito é responsável pelos pensamentos simbólicos e criativos. Minha teoria é que, de alguma forma, esses dois lados "colidiram", transformando o lado direto (que deveria ser o dinâmico e produtivo), em algo que ele recusa ser parte dele por ser "mau". Com isso, o lado esquerdo (que deveria ser o sadio) torna-se louco por causa dessa constante batalha dentro de si, pois como ele fala "Certamente, minha mulher vai afligir-se com a loucura que me persegue". Essa loucura é chamada de "Paulo", e é uma fração do indivíduo, mas que foi oprimido por este aborrecê-lo. Após algum acontecimento marcante ou algo que ativou a parte da memória reprimida do indivíduo, pode ter ocorrido o desencadeamento de Paulo.
1-A voz que narra os acontecimentos é da personagem principal do conto. Isso traz uma "conexão" entre o mundo real e o fantástico. Esse narrador onisciente cria condições do leitor acreditar no que está sendo contado através da constante recapitulação de elementos da realidade como o "hospital" e sua "mulher".
ResponderExcluir2-É narrado uma batalha psicológica do protagonista contra um intruso desconhecido ou até um drauma cerebral durante sua estádia hospitalar. Aparentemente o inimigo da personagem é seu próprio corpo, ou parte dele, nomeado como "Paulo". O momento que caracteriza a extrapolação da realidade está no delírio do homem e na crença da existência de outro ser compartilhando seu corpo.
3- No ambiente a dualidade se encontra nos funcionários e na estética do hospital que parece sucumbir cada vez mais o protagonista. Conforme sua dor aumenta os elementos do quarto refletem e ampliam seu desconforto: "A neblina se dissipa, as paredes se aproximam, estão visíveis as folhas dos coqueiros e o telhado da penitenciária, o avental da enfermeira aparece e desaparece".
4-Para mim, Paulo é fruto da imaginação do protagonista que está sofrendo de um trauma cerebral em que teve como consequência a paralisação do seu lado direito do corpo. Isso levou a complicações e ao delírio da pessoa que está perdendo a sanidade aos poucos. A dor e o desconforto o faz querer que separem seu corpo deixando sua metade inútil no hospital e levando a outra pra casa em paz. A impossibilidade de extinção do sofrimento o leva a encarar esse trauma como um ser que o quer prejudicar e por isso o nomeia como "Paulo".
Estou gostando muito das análises, mas Giovanni preste atenção ao tipo de narrador!
ExcluirDepois comentarei em classe!
Abs.
1. A voz que conta a história “Paulo” é justamente homem enfermo que tem seu corpo “invadido” pelo miserável que o corrompe, Paulo. O narrador em primeira pessoa permite ao autor e ao leitor uma penetração no psicológico do personagem-narrador que os outros tipos de narradores não permitem, até porque, os fatos são narrados sob uma perspectiva no mínimo interpretativo-sentimentalista. Partindo disso, posso afirmar que esse tipo de narrador afeta a história trazendo uma visão subjetiva dos fatos, e até de quem é Paulo, muitas vezes ele se exime de certa culpa de ele mesmo pode ter criado o Paulo e coloca o ultimo como o vilão/invasor que o corrompe.
ResponderExcluir2. O episódio que é narrado no conto é a situação de um homem que trabalhava muito, não dava atenção a sua mulher e agora enfermo e num hospital todo ferido, anseia a liberdade de pelo menos caminhar pelas ruas. Esse homem sente seu lado direito controlado, literalmente, por outra pessoa, Paulo, e durante o desenrolar da história observamos a dualidade entre o protagonista em querer se livrar do algoz e o segundo tentando matar primeiro. O elemento fora do comum que desequilibra a realidade é o fato da metade direita do narrador-personagem ganhar vida, personalidade própria na figura de Paulo.
3.A dualidade ocorre nos espaços do conto a partir do hospital que, impossibilitando a “liberdade” do narrador, torna-se uma forma de prisão e Paulo é para o protagonista justamente isso. Na personagem masculina pelo simples fato dele ”ser” dual, quer dizer por ter duas metades, a todo o momento ele se encontra totalmente confuso no plano da realidade com o plano do fantástico, não sabe se conhece ou não Paulo.
4.Sincera e honestamente não acredito que a intenção de Graciliano Ramos foi apenas escrever sobre o distúrbio mental de uma pessoa, cientificamente falando, penso mais pelo lado metafórico para interpretar o personagem Paulo. O narrador diz o seguinte num ponto da história, “Recordações de tipos odiosos, rancor, a ideia de ter sido humilhado, muitos anos antes, por um sujeito que se multiplicava”, transpondo isso para outras palavras acredito que o próprio protagonista que criou Paulo. Entendo que ele seja a verdadeira personificação de uma consciência ou porque não dizer de uma culpa do passado do protagonista que ele tenta esconder do leitor que conhece. E é impressionante que, mesmo sem percebermos, muitas vezes guardamos algumas fotografias do nosso passado que nos consome, carregamos fardos e obrigações que muitas vezes não são nossas, mas para sustentar algumas expectativas colocadas em nós, às incorporamos. As pessoas às vezes se sentem tão autocríticas e se responsabilizam tanto pelos seus atos que se tornam indigentes, vazias de si mesmos, sem forças para ser autenticas. E... o que isso tem a ver com insônia? Não sei, mas talvez o Paulo de muita gente consiga até tirar o sono.
1. A própria personagem é o narrador, a voz que conta a história. A escolha desse narrador estabelece a linha tênue do que se pode dizer real ou fantástico, visto que a história é narrada por aquele que à vive e portanto, é a testemunha que comprova a verdade desta.
ResponderExcluir2. O episódio onde o narrador sofre delírios onde luta com alguém que está dentro dele mesmo, esse alguém denominado Paulo é o elemento fantástico, fora do comum que desequilibra a realidade da história.
3. A dualidade se torna aparente em momentos de delírio e ocorre no espaço (hospital) tal que esse se torna obscuro e os elementos deste também sofrem mudanças, e na personagem a partir de Paulo a "outra" personalidade que se encontra no próprio protagonista.
4. Pra mim, Paulo é fruto da imaginação do narrador que está doente e o cria para justificar sua dor, Paulo representaria a doença o mal que há no narrador e deve ser separado dele.
Olá, finalizado o prazo para a tarefa, respondo a todos que publicaram suas análises.
ExcluirTodos vocês fizeram ótimas leituras do complexo conto "Paulo", de Graciliano Ramos!
"Paulo" apresenta a história de um homem à beira da morte, em um hospital, em meio a delírios e devaneios. O narrador em 1ª pessoa contribui para que vejamos os fatos sob a ótica do protagonista agonizante, em uma espécie de monólogo interior.
Neste momento difícil, o protagonista passa por um processo de autoconhecimento, reflete sobre sua vida social, quando são, antes de passar pela cirurgia.
Essa busca traz o tema do "duplo" bastante presente na literatura fantástica: há o desdobramento do corpo do narrador. Seu lado são tenta ser racional, mas há o lado doente e agonizante, nomeado por "Paulo". Na narrativa, essa duplicidade ou desdobramento pode ocorrer também em elementos temporais e espaciais.
Em "Paulo", há dois espaços e dois tempos. O tempo atual, no espaço do hospital e o tempo da memória, no espaço social vivido pelo narrador antes da doença. Interessante que alguns de vocês perceberam que o protagonista não estava muito satisfeito com a vida que levava e "Paulo", seu outro eu, parece vir para culpá-lo e torturá-lo.
Temos a temática do "duplo" presente em outros autores, na literatura fantástica:
- "O duplo", Coelho Neto;
- "O espelho", Machado de Assis;
- "O outro", Jorge Luis Borges;
entre outros!
Parabéns a quem atendeu ao desafio de leitura e análise do conto!