sexta-feira, 21 de novembro de 2014

NOVO ACORDO ORTOGRÁFICO ? CONSTRUA SUA OPINIÃO

Novo Acordo ortográfico?
Mudar a mudança? Você é a favor ou contra? Conheça  a nova proposta de simplificação da língua portuguesa e deixe um comentário a respeito. 

Quem tem medo de mudar a mudança?
Conservadores podem perder oportunidade única de simplificação ortográfica

Por Everardo Leitão

Quem tem medo de mudar a mudança? A elite (sic). Pronto, falei. Não queria o mico da palavrinha datada, mas não tive escolha: a elite linguística não quer nem saber de simplificar o português. Um pouco de unificação ainda vá lá, desde que com regras desregradas e muitas, muitas exceções, para defender bem defendida a reserva de mercado dos conhecedores de inutilidades. Mas simplificação de verdade, nem pensar. Por isso, não concordam em alterar o acordo troncho que nos divide.
O acordo ortográfico de 1990 tinha o objetivo de unificar a ortografia. Estamos vendo a dificuldade de colocá-lo em uso. Outros países relutam em implantar o assinado, e nós implantamos o não acordado, porque nossa Academia Brasileira de Letras inventou e mudou regras. Só os guardiões oficiais do acordo dizem que está tudo bem. Os que vivem no lado pé no chão da realidade têm mais é de estar céticos quanto à vigência plena. Quer dizer, é boa hora para avançar de verdade nas mudanças.
Sabemos que simplificar não estava no projeto. Foi um erro - já que vamos mudar, aproveitemos para buscar: economia: diminuição de horas inúteis das aulas de ortografia, assunto que ninguém consegue dominar hoje; inclusão social: aumento do número dos que escrevem o português que abre portas no mercado.
Os conservadores vivem desfiando, porém, um sem-número de argumentos falsos para fugir da simplificação.
Dizem que é impossível ter ortografia de base fônica. Balela. Para começar, ninguém que conheça essa velha discussão defende escrever como se fala. O que se diz é que é possível sim avançar com um mínimo de racionalidade para eliminar confusões evitáveis.
Típico de quem pensa ter monopólio da inteligência, os tradicionalistas tratam quem defende racionalidade como ingênuo sem ideia do tamanho e da complexidade da tarefa. Mas qual seria o pecado de unificar a escrita do fonema // com : "prezado", "ezame" e "avizo"? É um exemplo do que se pode avançar sem problema de variação de pronúncia. Caso do hífen, que pode até simplesmente acabar. Por que não "entregarlhe", "Grã Bretanha", "antiidiotice", "cor de rosa", "superhomem", a exemplo de outros idiomas?
Mudemos só o que não leve a uma guerra de secessão, e já estará de ótimo tamanho.
 Fala
Outra falácia: ortografia não é para representar fala. É sim. Aliás, é sua razão de ser. Não é à toa que escrita vem depois de fala na história das línguas. Só deve é estar a salvo das variações de pronúncia para garantir a unidade necessária à comunicação.
A etimologia também não é justificativa para impedir que se facilite a vida do usuário, que não conhece origem de palavra nem precisa conhecer. Guiar-se por ela na escrita é um tabu que deve ser quebrado. Isso não tira importância do estudo etimológico. Apenas acaba com uma tirania que separa a língua do legítimo dono.
Por fim, o argumento econômico. Foi gasto muito dinheiro na adaptação às regras sem lógica do acordo. É muito, mas não chega nem perto do desperdício de manter uma língua que ninguém sabe escrever, ainda que torrados todo ano milhões (bilhões?) em aulas inúteis sobre o inaprendível: hífen e uso de s/x/z/sc/c/ç/ss/g/j. Não mexer aí é, isso sim, continuar rasgando dinheiro para sempre.
E o ganho mais importante nem é o dos reais dos orçamentos - é o de mais usuários com domínio da escrita do português dos melhores salários, é a possível universalização desse domínio.
O problema é que os doutores da língua não leem nem ouvem o que se diz agora sobre o assunto. Ficam repetindo contra-argumentos estereotipados como se ainda conversassem com inocentes de séculos passados. É preciso que alguém avise que o debate mudou.
Desonestamente, oficialistas tentam fazer crer que defender revisão é retroceder. Ao contrário, o que se quer é avançar e mudar ainda mais. Quem quer segurar a modernização factível são eles.
Marias Antonietas
Quando se começou a questionar o acordo, o apoio público dos acadêmicos ao debate foi quase nulo. Poucos quiseram pegar no pesado trabalho político de despertar consciência para a rediscussão. Foi só o Senado criar um grupo para coordenar o debate, no entanto, e o que tem de gente fina reclamando ser ouvida não é brincadeira. Ótimo. Que falem também. Boa pergunta: por que estavam calados se o debate é público? Faltou convite em papel timbrado?
Democratas do pensamento linguístico único não querem facilitar a escrita. Já se puseram contra rever o acordo. Não que discordem de alguma sugestão de mudança - não querem nem discutir. Querem que tudo fique como está, porque assim a gentalha continua longe, falando e escrevendo - quando muito - sua variaçãozinha de periferia.
Enquanto isso, o doutor do falso respeito à diversidade pode continuar olhando de Versalhes para baixo, achando lindo o português que eles lá falam e escrevem, mas sem tolerar a heresia de um nois vai na boca e no texto do próprio filho. Então, qualquer tentativa de facilitar a vida da plebe rude só pode é mesmo ser rechaçada sob as mais diversas desculpas. Falta pão? Que comam brioche.
Dificuldade
Por isso é um erro deixar especialista decidir. É também falácia que o processo deva ser dirigido por especialista. Técnico é para opinar, como autor de parecer, que propõe caminho para quem decide. O processo é sábio, porque assim fica controlada a visão estreita e autocentrada do experto. Decisão sobre o que implantar deve ser do patrão usuário, representado no caso pelo legislativo dos países lusófonos.
Façamos igual com a ortografia. O especialista - linguista, etimologista, gramático, filólogo ou operário professor - propõe e busca convencer o usuário, esse leigo em ciência mas doutor em prática. Quem tiver maior poder persuasivo emplaca a proposta.
Não tenho pronto o pacote do que mudar, mas creio ter o como: discussão aberta, com prazo, e decisão a cargo de representantes dos parlamentos.
Deixem a decisão para especialista e vamos acabar do jeito que começamos: desunidos, confusos, mas com regras calcadas em erudição de quinta. Sem contar mortos e feridos na luta por vistosas sinecuras.
In: Revista Língua Portuguesa, edição 109, Novembro 2014 http://revistalingua.uol.com.br/textos/109/quem-tem-medo-de-mudar-a-mudanca-330451-1.asp  

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